Há uns tempos fui a Braga entrevistar Adolfo Luxúria Canibal acompanhado pela manita Mirabelle – meia francesa e não conhecia os Mão Morta – que se revelou de imediato seduzida com o som e as letras da banda de culto mais antiga da música portuguesa. E disse: “Se na minha adolescência eu também tivesse gritado “quero morder-te as mãos”, ao longo dos anos provavelmente não teria mordido tantos desgraçados”. Lá no cimo, no Bom Jesus, o cantor foi tirar umas fotos na casa-de-banho e quando voltou não me surpreenderam os antagonismos entre Luxúria Canibal, o vocalista, e Morais Macedo, o jurista. O que me apanhou desprevenido foi a forma como atacou, sem rodeios, a Igreja e a terra em que vive, “onde há uma maledicência generalizada e uma entediante pasmaceira”, e o facto de nunca ter votado porque não se revê representado por outrem, “seja ele quem for”. Todavia, o que me avocou foi a forma como se referiu à morte como sendo “extraordinariamente atractiva, algo que nos enamora e nos alicia constantemente”. Referia-se às dores da alma, “as dores que fazem com que haja tantos suicídios entre os adolescentes”. E tu, Adolfo, já pensaste em te suicidar? “Pensei, é evidente. Até um dia em que, depois da ideia de suicídio ser em mim recorrente, perceber que a morte estava sempre à mão. Se a coisa corresse mal cometia o acto”. E como? “Para mim está sempre associado à pistola”. É este abraçar ilimitado de possibilidades, com derrapagens, fios da navalha e tudo o que isso tem de excitante e dramático, que fascina os que não desistem da fuga à normalidade.
sábado, 19 de abril de 2008
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